*Por Vanessa Pareja
Entendo o peso dessa constatação e seriedade da crítica, logo vou tentar aqui explicar o meu ponto de vista.
O “caso CBDEL” dá o tom da regulação dos e-sports no Brasil. A CBDEL se autointitula como a entidade de administração dos esportes eletrônicos no Brasil, com a atribuição de criar, regulamentar e operar os esportes eletrônicos em todas as suas categorias.
Em carta conjunta, emitida em 2018, os principais times de e-sports e as desenvolvedoras de jogos e torneios de e-sports no Brasil, formalmente declararam que não reconhecem a CBDEL como representante ou autoridade no que se tange aos e-sports praticados no Brasil.
Isso não impediu, no entanto, que só no ano de 2022 fossem apresentados quatro projetos de lei, visando exatamente o que o próprio mercado repudiou, tornar a CBDEL a entidade nacional de administração do desporto eletrônico, com status semelhante a CBF e o COB.
Atualmente, só no Congresso Nacional, temos vigentes cerca de nove projetos de lei que visam de alguma forma regulamentar os e-sports.
Em sua maioria, essas iniciativas incluem os e-sports no contexto da Lei Pelé ou até mesmo na discussão da nova Lei Geral do Esporte, atualmente em trâmite no Congresso. Ao avaliar os principais projetos de lei, nota-se como elemento comum uma correlação óbvia de causa/solução que, sem sequer avaliar as peculiaridades dos e-sports, necessariamente conclui por sua inclusão nas mesmas normas aplicadas aos esportes, sem nunca aventar os impactos que isso pode ter no mercado.
Sempre considerei essa solução peculiar. Por qual motivo se tenta sujeitar coisas diferentes às mesmas normas? Os e-sports são uma modalidade competitiva proprietária, ou seja, o próprio direito de acessar o jogo e jogar é limitado e condicionado aos termos autorizados pelas empresas donas dos jogos eletrônicos.
Isso não ocorre com qualquer outra modalidade esportiva atualmente existente, na qual o direito de acessar o jogo e jogar é livre.
Na prática, isso seria equivalente a dizer que nos eSports, a bola sempre tem dono e para jogar você tem que seguir os termos e regras propostos. Ambos têm sim poucas similaridades inerentes a qualquer prática competitiva, mas são completamente distintos em sua natureza.
De fato, essa diferença é tão significativa que ao regular ambos com as mesmas normas, geramos uma insegurança jurídica grave que pode acabar sufocando um mercado com um potencial muito grande no Brasil.
Os e-sports devem sim ser parte de políticas públicas de incentivo no Brasil, podendo até mesmo vir a ser regulados em poucos aspectos que se verifique como necessários. No entanto, não posso deixar de clamar para que qualquer regulação dessa prática se dê de forma cuidadosa e à luz de suas peculiaridades.
*Vanessa Pareja Lerner lidera a prática de tecnologia e proteção de dados no Dias Carneiro Advogados