Publicado em 19/10/2018 - Notícia

Empresas de games evitam Judiciário com termos de uso claros ao jogador

DCI

Deixar bem definido o que usuários não podem fazer em partidas online e quais são as punições cabíveis ajuda a evitar litígios caso quem seja banido deseje recorrer ao CDC contra a companhia

A responsabilização judicial das empresas desenvolvedoras de games pelo comportamento tóxico de seus usuários em partidas online se torna mais difícil quando a companhia elaborou um bom contrato de termos de uso.

Segundo a advogada do Dias Carneiro Advogados, Vanessa Pareja Lerner, definir claramente aquilo que os jogadores não devem fazer durante um game online e as punições cabíveis, como banimento temporário ou permanente, é importante para evitar qualquer dor de cabeça na Justiça. “O que acontece frequentemente é o usuário que comprou o jogo, itens cosméticos – caracterização de personagens – ou aqueles que afetam a jogabilidade ajuizar ação por ter perdido dinheiro com o banimento. Com os termos claros, é possível assegurar a punição”, diz a especialista, que atende a diversas marcas do setor.

De acordo com Vanessa, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) deve ser limitado àquilo que as empresas permitem que o usuário faça com seus produtos. O problema, nesses casos, é se o juiz que relatar o processo não entender do assunto. “Depende muito de cada magistrado, porque infelizmente ainda não temos uma jurisprudência sobre esses temas nas instâncias superiores”, avalia a advogada.

Por outro lado, a especialista conta que não é tão comum o Judiciário responsabilizar a desenvolvedora de um jogo por uma ofensa que um jogador dirige a outro, visto que não é possível fiscalizar o comportamento de todos os usuários, mas agir com rigor em casos denunciados ajuda a evitar o risco reputacional. “Tomar providências é bom, mas o agente privado não pode agir com poder de Justiça”, explica.

Já o diretor do Instituto de Direito Público de São Paulo (IDP-São Paulo) e criador da Future Law, Alexandre Zavaglia Coelho, entende que as empresas não devem entrar nessas polêmicas. “No direito digital, temos provedores de conteúdo e de aplicação. Os de conteúdo organizam as manifestações e retiram o que for inadequado, mas os de aplicação, como games, YouTube, e outras redes sociais não são responsáveis pelo conteúdo. Isso está pacificado no Marco Civil da Internet e na jurisprudência”, destaca o especialista.

A Lei 12.965/2014, conhecida como Marco Civil, determina em sua Seção III – que trata da responsabilidade por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros – que: “o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.”

Para Zavaglia, a empresa que provê o conteúdo não pode ser responsabilizada, e portanto, só deveria agir quando instada a isso por uma decisão da Justiça. “Qualquer exclusão de conteúdo tem que ser por via judicial.”

Vanessa lembra, contudo, que há casos mais graves, como para os grandes jogadores de e-sports, que possuem mais visibilidade, são assistidos por milhões de pessoas e podem gerar graves danos à imagem dos jogos em que se destacam.

Regulamentação

A advogada do Dias Carneiro ressalta que há uma demanda forte pela regulação do mercado de games no Brasil, principalmente com a expansão da cena de e-sports e jogos com foco no multiplayer competitivo. “Há uma discussão de incluir e-sports na legislação esportiva, mas há inconsistências, como o direito de arena para um esporte que é de propriedade de uma empresa”, expressa.

Hoje, existe uma resistência relevante das desenvolvedoras de aplicar a Lei Pelé nos e-sports. Ainda mais com as discussões sobre se os games são cultura ou esporte.

É justamente esse poder das companhias sobre o que se faz nos campeonatos que permite punições mais fortes aos indivíduos que se envolvem em ofensas que podem até serem consideradas crimes no caso de racismo, por exemplo. “Dá para excluir o jogador e tirar pontos”, conclui.