Publicado em 02/08/2018 - Notícia

Maia quer aprovar tributação de fundos fechados; juristas discutem imposto sobre ganho acumulado

Arena do Pavini

Ao chegar para a Convenção Nacional do Democratas, na Câmara dos Deputados, o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), informou que vai dar prioridade, na semana que vem, ao debate sobre o projeto de lei que muda a taxação dos fundos fechados.

O governo federal enviou ao Congresso Nacional, no início da semana, a proposta com alteração na cobrança de Imposto de Renda incidente sobre rendimentos de aplicações em fundos de investimento fechados. Destinados a grandes investidores e restritos a famílias ou pequenos grupos de sócios, esses fundos só pagam imposto sobre seus ganhos nos resgates ou quando são liquidados. A proposta do governo é que esses fundos paguem imposto sobre os ganhos em maio e novembro de cada ano, como ocorre com os fundos abertos de renda fixa e multimercados com o chamado come-cotas.

A medida também acaba com o uso desses fundos como holdings familiares ou de grupos, o que reduz sua tributação.

No ano passado, o governo tentou alterar a tributação sobre fundos financeiros fechados com uma medida provisória, que perdeu a validade.

“Vamos começar a construir a partir de hoje a votação do projeto sobre a taxação dos fundos fechados, porque é uma demanda urgente do governo para aumentar a arrecadação. Vai mexer em renda fixa”, disse Maia.

Projeto de estrangeiros na aviação

Outro projeto citado por Maia como prioritário é o que aumenta a participação do capital estrangeiro na aviação civil. Segundo ele, é importante “para que empresas possam investir no setor aéreo brasileiro para reduzir o valor das passagens”.

Rodrigo Maia disse que vai conseguir quórum para votar os projetos. “Vamos trabalhar na semana que vem, no início da outra [a partir de 13 de agosto], e na primeira semana de setembro. Temos três semanas para votar. Temos alguns temas que podemos votar e outros que a gente vota a partir de outubro”, disse referindo-se às semanas de esforço concentrado antes das eleições de outubro.

Tributação deveria ser só sobre o rendimento futuro, diz jurista

A proposta atual de tributação dos fundos fechados é muito próxima do texto da medida provisória que caducou, observa Antonio Amendola, sócio do escritório Dias Carneiro Advogados. “E os problemas que identificávamos lá atrás permanecem”, diz. O principal é o regime de transição da medida. A regra atual prevê que mesmo os rendimentos obtidos pelo fundo antes da mudança do imposto terão de pagar a tributação. “Mas esses ganhos ocorreram quando a legislação era outra”, defende. Segundo ele, se a mudança da legislação vai valer a partir de janeiro do ano que vem, deveriam ser tributados apenas os ganhos obtidos a partir de 2019. “É legal e justo alterar a regra, mas ela deve incidir sobre o que for o ganho depois da mudança, a partir de 2019”, afirma. “É o que precisa ser feito, para preservamos a segurança jurídica e não mudar a tributação sobre o passado”, explica.

Caso a medida passe do jeito que está, o resultado devem ser inúmeras ações judiciais contestando o novo imposto. “Reconheço que o governo precisa de recursos com urgência, mas ele não pode atropelar o sistema jurídico para aumentar a arrecadação”, alerta. Amendola cita outra lei, a 8.981, de 1995, que também mudou as regras de tributação dos fundos, mas observou que a validade seria apenas para os ganhos obtidos depois da alteração. “O tema do estoque de rendimentos é complicado e alterar a regra no meio do jogo é errado”, diz.

Ele lembra que há fundos que podem não ter dinheiro disponível para pagar o imposto antigo de uma só vez. E que a medida pode apanhar fundos de participações em empresas sem liquidez. “O ideal era que a norma estabelecesse que só fundos com metade do patrimônio em ativos financeiros fossem obrigados a pagar o imposto semestral”, diz. Ele defende a medida, especialmente para fundos que aplicam em renda fixa e são usados para adiar a tributação de famílias, empresas ou grupos econômicos, lembrando que é justo que todos os investidores paguem imposto. “Mas se passar desse jeito podemos ter uma guerra judicial”.

Cobrança sobre estoque pode ser feita, avalia advogado

Já para Alamy Candido, sócio do escritório Candido Martins Advogados, a cobrança sobre os ganhos anteriores à mudança da lei é legal. “Há uma interpretação de que o imposto não pode ser cobrado porque o fato gerador já aconteceu”, diz. “Mas não é bem assim, o que acontece é que hoje há uma regra de diferimento, que permite ao fundo não pagar o imposto agora, mas no futuro, e o governo está mudando esse diferimento”, explica.

O que pode ser discutido é o princípio da anualidade, que impede que se cobre o imposto no mesmo exercício da mudança. “Mas isso será resolvido pois a medida só entrará em vigor no ano que vem”, lembra Candido. “Pode-se alegar que se tratam de fatos geradores passados, mas o que existe é uma regra de diferimento de imposto que está caindo”, afirma. “E o governo pode, por meio de um projeto de lei, instituir uma tributação do pedaço que não foi cobrado lá atras, que era diferido, aguardando o resgate ou a amortização do fundo” diz. “Agora o governo suspende o diferimento e trata a cobrança em maio e novembro como se fosse um resgate para cobrar o imposto”, explica. “Vai ter discussão, mas não acho que o governo vai perder”.

Estratégia melhorou e tem mais apoio no Congresso

Candido diz que a forma como a proposta foi reapresentada, como um projeto de lei, é melhor que a anterior, via medida provisória. Além disso, o governo parece estar empenhado na aprovação, assim como o PSDB e seus aliados do Centrão, incluindo o DEM, do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que precisarão desses recursos de impostos sobre fundos fechados se o candidato Geraldo Alckmin ganhar. “As chances de aprovar são maiores pois agora tem apoio para fazer isso pensando no próximo governo”, afirma.

FIPs patrimoniais devem mudar

Candido cita algumas alterações feitas no projeto, que trazem uma clareza um pouco maior com relação à questão dos fundos de participações (FIP), que costumam ser usados por algumas famílias e grupos como se fossem holdings empresariais, controlando empresas. Era uma forma de consolidar as estruturas sem pagar os impostos e sem as exigências das estruturas normais de holdings empresariais.

Agora, o governo vai separar efetivamente os FIPs que servem para viabilizar investimentos em novas empresas dos que servem de holdings disfarçadas. “Mas a raiz do projeto ainda é tributar os fundos e o estoque de ganhos e colocar tributação semestral”, observa Candido. Foram excluídas da cobrança algumas estruturas como fundos de ações, imobiliários de direitos creditórios (Fidc), FIPs e fundos estrangeiros específicos.

Famílias devem se antecipar às mudanças

Candido recomenda que as famílias e grupos que têm fundos fechados se movimentem antes que a cobrança comece. Uma família com um fundo fechado com várias estruturas de aplicação poderia se reestruturar para segregar os fundos imobiliários, ou de ações, para evitar que a tributação incida sobre todos eles. “Se fizer a segregação, pode deixar no fechado apenas o que não puder ser retirado”, diz.

Mesmo as famílias ou grupos que usam FIPs como holdings já podem começar a ajustar suas estruturas. “Com as novas regras, os FIPs patrimoniais vão passar a pagar os mesmos tributos e deixarão de ser vantagem em relação às holdings pois, além de tudo, ainda têm um custo anual de cerca de R$ 300 mil que não fará mais sentido”, diz Candido. “Fará mais sentido usar uma holding ou mesmo a pessoa física”, explica.

Com informações da Agência Brasil.